Autor(es): Sérgio Miguel Buarque
Correio Braziliense - 10/06/2007
Em Orobó (PE), estudantes deixavam de ir à aula por falta de sapatos
Quanto custa o desafio de colocar uma criança dentro da sala de aula? Em Orobó, cidade da Zona da Mata, no norte de Pernambuco, a Secretaria de Educação do Município enfrentou o problema desembolsando apenas RS 1,99 por aluno. A iniciativa, além de barata, nasceu de uma idéia surpreendentemente simples para enfrentar uma questão reconhecidamente complexa. Os resultados alcançados contribuíram, inclusive, para que a cidade cumprisse as metas estabelecidas pelo Unicef e fosse certificada com o Selo Município Aprovado. Mas é preciso contar a história do começo.
Depois de uma série de ações na educação, Orobó vinha conseguindo aumentar o número de matrículas no ensino infantil da rede municipal. Em 2005 foram 821 alunos. No ano seguinte, 1.084. Em 2006, um salto para 1.127. Só que as matrículas não significavam efetivamente a presença da criança dentro da sala de aula. Um levantamento mostrou que, mesmo inscritos, 513 potenciais estudantes ficavam em casa.
Quantificar o problema até que foi fácil. A questão fundamental era saber por qual motivo os meninos e meninas não chegavam à sala de aula. Foi aí que entrou em ação a figura do agente de educação. Vinte e três pessoas percorreram o relevo acidentado e as estradas de barro que interligam as comunidades da zona rural e distritos do município. Orientados pelas escolas, o agentes foram de casa em casa conversar com os pais e com os próprios estudantes. O contato direto com a população revelou uma cruel realidade: os alunos, em grande parte dos casos, não iam ao colégio simplesmente porque não tinham sapatos.
A informação, que chegou no final do ano passado, chocou a secretária de Educação do município, Valdenice Aguiar. A própria Valdenice foi a uma fábrica de calçados no Recife disposta a resolver o problema. Aí veio a surpresa. “Cheguei lá num dia de promoção. O par da sandália, que custava em torno de RS 7, estava sendo vendido por RS 1,99. Comprei mais de 500”, lembra. Os próprios agentes retornaram às casas dos estudantes para entregar os chinelos.
Cristiane Souza é uma das crianças que receberam os chinelos comprados pela prefeitura de Orobó. Aos 7 anos, ela já cursa a segunda série. Ainda não sabe escrever “muita coisa”, confessa timidamente. Possivelmente, pela falta de continuidade nos estudos. A menina se enquadra no perfil das crianças que, apesar de matriculadas, não freqüentavam a escola por falta de sapato.
Cristiane mora no Sítio Olho D’água Seco, uma das comunidades rurais de Orobó. Da casa dela até a escola municipal Sebastião Barbosa é uma longa caminhada pelas ladeiras de barro. Depois das sandálias ela voltou a fazer o percurso, agora com um pouco mais de conforto e dignidade.
No sertão paraibano, o município de Aparecida também vem travando uma luta dura para manter as crianças e adolescentes dentro da sala de aula. De um lado, os professores e o discurso do futuro. Do outro, a roça e a imposição do presente, da sobrevivência. No embate das duas realidades, a escola vinha perdendo os alunos para o trabalho, principalmente no período de colheita. O jogo começou a virar a partir de 2005. E com uma simples mudança de rotina. As escolas criaram estratégias para atrair e envolver os pais das crianças no processo de ensino.